Vamos Falar Sobre Culpa
- Pedro Gatti Lima
- 27 de jun.
- 3 min de leitura

A culpa é uma emoção humana — talvez das mais complexas. Às vezes, aparece como um alerta: um sinal de que algo que fizemos feriu alguém ou feriu a nós mesmos. Outras vezes, vem silenciosa, disfarçada de peso constante, de autoexigência, de vergonha. Há ainda aquela culpa que nem sabemos nomear, mas sentimos — no corpo, na ansiedade, na dificuldade de se permitir viver.
Na psicoterapia, a culpa costuma aparecer com frequência. Seja como um sofrimento presente, seja como um pano de fundo que contamina relações, escolhas e até o modo como a pessoa se enxerga.
Culpa ou responsabilidade?
É importante fazer essa distinção. A culpa costuma nos imobilizar. Traz a sensação de sermos intrinsecamente ruins, errados, falhos. Já a responsabilização abre caminho para o cuidado, para a possibilidade de reparar algo, para aprender com os erros. Assumir responsabilidade por algo que fizemos ou deixamos de fazer não significa carregar um fardo eterno. Significa amadurecer emocionalmente.
A culpa que aprendemos
Muitas das culpas que carregamos nem sempre têm a ver com algo que fizemos de fato. São culpas introjetadas — ideias, normas e exigências que absorvemos desde cedo, muitas vezes sem perceber. A criança que aprendeu que devia agradar a todos, que não podia errar, que precisava ser perfeita para ser amada, cresce com um juiz interno severo. E esse juiz, mesmo sem causa justa, segue condenando.
Essas culpas aprendidas podem nos levar a silenciar desejos, a evitar confrontos, a se desculpar por simplesmente existir do nosso jeito.
Quando a culpa adoece
Há uma culpa que não é só passageira — é uma presença constante. Ela aparece como autocrítica excessiva, como vergonha do próprio corpo, como dificuldade em se permitir sentir prazer ou fazer escolhas próprias. Pode estar relacionada à ansiedade, à depressão, à procrastinação. Em vez de nos proteger, essa culpa nos paralisa, nos diminui, nos afasta de nós mesmos.
Culpa e sexualidade
Um dos territórios mais marcados pela culpa é o da sexualidade. Ainda hoje, muitas pessoas se sentem sujas ou erradas por sentirem desejo. A masturbação, por exemplo, que é uma expressão natural da sexualidade, ainda é cercada de vergonha, medo ou repressão.
Essas sensações, na maioria das vezes, não nascem do corpo — mas das ideias que recebemos sobre ele. Ideias que associam prazer ao pecado, desejo à fraqueza, liberdade ao desvio. O resultado? Pessoas que vivem divididas entre o desejo e a culpa. Que não conseguem relaxar, se entregar, se permitir.
Na clínica, é possível olhar para essas culpas com cuidado. Entender de onde vêm, qual papel têm cumprido, e o que pode ser feito com elas. A sexualidade, quando vivida com respeito por si e pelo outro, não deveria ser motivo de vergonha. O corpo não é sujo. O prazer não é um erro. Você não é errado por sentir.
Escutar a culpa, sem se definir por ela
Na terapia, não tentamos apagar a culpa, mas compreendê-la. Dar um lugar a ela. Porque muitas vezes, por trás da culpa, existe algo mais: tristeza, medo, necessidade de pertencimento, ou a dor de não se sentir suficiente.
Falar sobre culpa é abrir espaço para outras possibilidades. É deixar de ser prisioneiro de um passado, de regras que já não fazem sentido, de um eu ideal que só causa sofrimento.
Você não precisa carregar tudo isso sozinho. A culpa pode ser escutada — e transformada.
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